Os designers precisam mesmo de diploma? Vindo de alguém com dois diplomas e que ocupa atualmente a diretoria em Minas Gerais da ABEDESIGN, sei que você espera um “sim” no final deste texto. Mas são esses papéis – além de ter um escritório de design gráfico e digital há 8 anos, claro – que me permitem ângulos diferentes do problema.

Desconte os relacionamentos que você constrói, as festas, a bebedeira e tudo mais. Um bom designer deve passar pela faculdade? É um tema delicado, e que costuma inflamar as opiniões, ainda mais em tempos de maniqueísmo político. Ao invés de tirar conclusões, gostaria de provocar reflexões, e analisar o que já está rolando no mercado de design. Vamos lá?

Design e empreendedorismo

Assusta um pouco o fato de boa parte dos empresários de design brasileiros não serem designers por formação. Conheço arquitetos e publicitários que comandam escritórios, mas também advogados, engenheiros e auto-didatas sem formação superior. São inteligentes, possuem um senso estético altamente apurado, defendem o design com unhas e dentes e (vários que conheço) são pessoas super legais. Então, por que não?

Ocorre que os currículos das escolas de design, em geral, não privilegiam a formação empreendedora. Aí, o que vemos? Designers que empreendem por paixão pelo design, e não por paixão em empreender. Sofrem com a falta de conhecimento em gestão, finanças, pessoas, comercial – temas estranhos àquela grade curricular. E se a empresa começa a dar certo, vem a constatação brilhantemente descrita por Malcolm Gladwell: quanto maior o seu sucesso, menos design você faz.

Na ABEDESIGN, tenho trabalhado duramente na qualificação empreendedora dos sócios de escritórios de design (eu incluído). Estamos negociando um amplo projeto de capacitação para 2017 com o SEBRAE Minas, que envolverá consultorias em grupo e individuais para melhorar a qualidade da gestão dos escritórios. Quer saber mais sobre esse projeto? Entre em contato!

Distância entre academia e mercado

Há uma grande distância entre o que se ensina na faculdade e o que se exige no mercado de trabalho. Isso se reconhece de ambos os lados. Empreendedorismo é um ponto sensível, mas as próprias práticas técnicas não são inteiramente cobertas, afinal design é “multi-trans-disciplinar” por natureza. É coisa demais para cobrir em um curso de 3 a 5 anos. Em especial, as habilidades digitais que o mercado exige são difíceis de encontrar em um designer recém formado, imagino que pela dificuldade dos currículos em acompanhar a evolução tecnológica. Esse jovem sai como um diamante bruto. É fundamental que ele procure não queimar etapas depois de sair da faculdade, e que escolha bons mentores para ajudá-lo a continuar se desenvolvendo nas áreas que tiver afinidade.

Essa distância não é problema exclusivo do design

Pergunte a um amigo engenheiro se ele realiza cálculos no emprego atual da mesma maneira que cursou na faculdade, ou a um advogado se ele sabe com profundidade todas as áreas do direito que estudou. A distância entre academia e mercado é natural, eu diria necessária. Ela existe aqui no Brasil, e lá fora também. Mas há uma diferença fundamental no modelo americano, que funciona melhor que o nosso nesse aspecto: a aproximação dos setores de pesquisa e desenvolvimento das universidades com as empresas privadas. Ainda não soubemos aproveitar da melhor forma toda a profundidade que um projeto acadêmico tem para resolver questões ou desenvolver produtos e serviços para negócios reais. Em design, esses exemplos são exceções, e não a regra.

Distância entre designers e compradores

Um estudo realizado pela Abedesign em 2015 apontou que os compradores de design não reconhecem com facilidade as várias disciplinas envolvidas na profissão, e as expertises – branding, identidade, editorial, promocional, digital, inovação, produtos, serviços, ambientes, moda, joias e por aí vai. Sem contar a banalização do termo design, cujo valor positivo é usado para agregar qualidades a todo tipo de negócio, sem necessariamente passar por processos de design.

O estudo só reforça uma constatação: quem entra na faculdade de design não sabe exatamente o que é design; e quando se forma, teoricamente dominando um pouco melhor as disciplinas, descobre que quem compra design, na maioria das vezes, não sabe exatamente como ou por que fazê-lo.

Essa distância certamente abre margem para uma especialização em “tradução do design”, isso é, pessoas capazes de tornar os benefícios do design palpáveis para quem não entende do assunto. E, pelo que tenho visto, não-designers costumam ser melhor tradutores do que os designers, por se despirem de um exagero técnico característico da profissão e focarem mais nos resultados que na execução.

O papel das faculdades de design

Não é a intenção deste texto dizer às faculdades de design que devem “rever seus conceitos”. Muito pelo contrário: a universidade precisa ser o espaço da experimentação, da introspecção e das disciplinas clássicas, como ciências humanas e história da arte. Nas palavras de um grande amigo, a faculdade deve ensinar a pensar, não a fazer. Entendo como uma escolha mercadológica da própria faculdade de design ser mais ou menos aderente ao que o mercado de trabalho exige para contratar um profissional. Porém, a Academia também vive pela Academia: escolas de design precisam formar bons professores, mestres, doutores. A produção intelectual acadêmica do futuro dependerá deles.

Sobretudo, a faculdade de design deve ser o ambiente mais propício para explorar os limites intelectuais e técnicos da matéria. Facilitar o intercâmbio de ideias entre alunos, professores, pesquisadores. Idealmente, esse ambiente deveria ser capaz de atrair e reter talentos e conhecimentos.

Do que precisa um bom designer?

De interesse, acima de tudo. Um bom designer está sempre com sede de buscar conhecimento. Está disposto a ler, a visitar, a viver. Precisa conhecer seu próprio processo criativo, e dominar as ferramentas que garantem que a execução estará, no mínimo, à mesma altura de sua ideia. Por tudo que já expus, esses conhecimentos não estão somente dentro de um curso universitário: é preciso buscar algo mais para se fazer valer no mercado de trabalho.

Um bom designer precisa também abandonar um pouco suas vaidades. Trabalho criativo sem vaidade não existe. Mas é aqui que o mercado morde e, ao contrário da faculdade, não assopra depois. A sua ideia brilhante só vale se for aceita pelo cliente, que nem sempre está disposto a assumir riscos. A menos que você escolha trabalhar com uma linha de design autoral, certamente irá sofrer com palpites absurdos, mas que, para quem está te pagando, podem até fazer sentido.

Por último, precisa de tempo. Desculpe generalizar, mas um dos males da geração que se forma hoje é o imediatismo, a impaciência para encontrar respostas e se dar ao trabalho. Problemas complexos exigem vários dias para se resolver. Acredite, o Google não tem todas as respostas, ou pelo menos não tem as melhores. O importante é simplificar a solução, jamais o problema.