Você decide comprar um tênis de corrida. Visita alguns sites especializados, estuda o assunto, pergunta aos amigos, tenta fazer uma compra racional. Fica olhando para o que está nos pés dos outros corredores. Procura no Google. Abre o Netshoes, Centauro, Dafiti. Levanta preços, cupons de desconto, frete grátis. Cansado, você deixa para amanhã. O ciclo se repete. O bombardeio com banners de remarketing domina a sua timeline.

Você se resolve: agora chega, hoje eu compro esse tênis. Escolhe um modelo, joga no Buscapé para ver o histórico de preços. Busca nas lojas novamente. Acha o produto em uma loja com um desconto “só hoje” imperdível. É esse! Compra o bendito tênis de corrida.

No dia seguinte, com o pedido já a caminho, outros banners continuam insistindo: e aquele tênis…? E apesar daquelas duas semanas de longas horas, noite adentro, lendo e escolhendo o tênis perfeito, você começa a se perguntar: será que eu fiz uma boa compra?

em-duvida

A beleza do auto-engano

Em sua obra Auto-engano, Eduardo Gianetti apresenta como nós, pobres mortais, temos mentes maleáveis, sabotáveis especialmente por nós mesmos. Quando queremos muito que algo funcione, nos enchemos de motivos para que aquilo dê certo; maximizamos o efeito dos fatores positivos e minimizamos os negativos de uma maneira desproporcional, entendendo-os de forma diferente do que em realidade são.

O melhor exemplo de auto-engano oferecido por Gianetti é também um dos mais corriqueiros: quem nunca adiantou o relógio alguns minutos só para evitar chegar atrasado em seus compromissos? Algo que é sabidamente falso – a hora do dia – é momentaneamente dado como verdadeiro para que você se permita manter o costume de atrasar e, ao mesmo tempo, concorde com a convenção social de cumprimento de horário. Loucura, né? Mas quem por aqui não é um pouco louco?

Em alguma medida, o auto-engano é até um mal necessário. Uma imunidade temporária as ameaças que também permite a empreendedores assumir riscos e conseguir minimamente colocar a cabeça no travesseiro à noite. Por outro lado, o auto-engano também facilita as escolhas dos clientes sem que eles se exijam grandes justificativas. Enganar-se é um caminho mais fácil para a felicidade.

É possível fazer uma compra racional?

Em todo negócio, há segmentos de clientes que tentam fazer compras racionais. Eles querem ouvir os atributos técnicos – potência, volume, desempenho, durabilidade. Mas ainda assim, não estão livres da emoção provocada pelo valor que a marca representa para eles. A segurança de sempre fazer um bom negócio, por exemplo. Ou a “certeza” que aquele produto não vai te decepcionar.

As emoções são fundamentais para interpretar corretamente os estímulos que recebemos. Emoção é o que traz segurança, e, ao mesmo tempo, prepara o corpo para o que se imagina estar por vir – perigo, atenção, ansiedade, alegria, todas se expressam, especialmente em nossas faces, sem que nós tomemos nenhuma medida consciente e objetiva a respeito.

O consagrado professor Donald Norman explora, em seu livro Design Emocional,  a nossa relação instintiva com os objetos do dia a dia. Segundo ele, essa interação se dá em três níveis:

Os níveis Visceral e Comportamental são, segundo Norman, inconscientes, portanto difíceis de domar. Já o nível Refletivo, ligado ao Super-ego, supervisiona o que acontece no cérebro, mas não está ligado à parte sensorial. E você, continua confiante que sua decisão é puramente racional?

VEJA TAMBÉM: Don Norman – 3 maneiras pelas quais o design te faz feliz (video TED Talks)

As marcas são, inevitavelmente, emocionais. O processo de escolha, dada a oferta que a internet proporciona, se tornou uma grande paralisia. Muitas vezes continuamos acreditando que, se o cliente não comprou, é porque não ouviu a proposição certa, não se informou corretamente, ou não valoriza os atributos do nosso produto. Seria mais fácil se fosse só isso.

Design é detalhe, e se você acredita que um detalhe não muda um jogo, não adianta nem te dizer para raciocinar a respeito. O design é emocional, lembra?